domingo, 18 de dezembro de 2011

O novo Telê


Logo que chegou ao Japão, Muricy Ramalho concedeu entrevista dizendo que Guardiola era um grande técnico, mas, para prová-lo de verdade, precisaria comandar um time brasileiro. Depois do jogo de hoje – ou mesmo antes –, alguém poderia dizer: Guardiola bem que poderia treinar a seleção brasileira.
Vale lembrar que Muricy só não é o técnico da nossa seleção porque, ainda no Fluminense, ouviu a recusa do presidente do tricolor carioca em liberá-lo. Há poucos dias, renovou seu contrato no Peixe com cláusula que lhe permite a saída em caso de novo convite por parte da CBF.
Ainda que não me empolgue com o trabalho mostrado por Mano Menezes, não me iludo com sua eventual substituição por Muricy. Nem por Luxemburgo, nem por Felipão ou qualquer outro treinador brasileiro. Gostaria, confesso, que o técnico do Barça ou alguém que assuma sua filosofia de jogo tomasse em mãos o Brasil até 2014. Aliás, por ironia, Guardiola é o maior herdeiro do estilo jogo das equipes de Telê Santana. Mais ainda que o próprio Muricy, que iniciou sua carreira com o mestre, no São Paulo.
Outra ironia: o futebol-arte, que Zico disse ser o maior derrotado no estádio de Sarriá, naquela fatídica tarde de 14 de junho de 1982, pela Itália de Paolo Rossi, parece estar renascendo na mesma cidade de Barcelona.  
Se há a tristeza pela derrota do Santos, também há um quê de esperança pelo resgate do melhor do nosso futebol brasileiro. Ainda que nasça em terras catalãs sob a batuta de Pep Guardiola, o novo Telê.
Por João Quirino

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Meu ídolo

Quando vejo um garoto de sete anos com brilho nos olhos ao se deparar com o craque Neymar, sou capaz de entendê-lo perfeitamente. Com sete anos eu também tinha um ídolo que entortava os adversários, muito embora não fosse tão rápido.
Os meninos de sete anos da época de Leônidas deviam se orgulhar da jogada que ele criara e operava como ninguém: a bicicleta. Não me lembro de nenhuma bicicleta dada por meu ídolo. Assim como não me lembro de ninguém usar o calcanhar com tamanha habilidade e visão de jogo como ele.
Compreendo os guris de Minas que aos sete anos idolatravam o atleticano Reinaldo e o cruzeirense Tostão. Como aquele, meu ídolo marcava gols e comemorava com o braço esticado para cima e o punho cerrado. Como este, também era doutor e vestia a oito.
Vi crianças de sete anos idolatrando Ronaldo e venerando Romário. Logo surgiram as comparações. Quem era melhor? Quando eu tinha sete anos, meu ídolo era comparado a Zico. Acho até que este era melhor, mas o bom é que estavam juntos na seleção de Telê, a melhor de todas para mim. E, como meu ídolo, Zico também sabia alegrar o povão, brilhando em um clube de massas. Multidões que se entristeceram quando o Galinho saiu do Flamengo, assim como eu e outros tantos milhões lamentamos a despedida do nosso ídolo rumo a campos italianos. Logo a Itália, quanta injustiça!
A propósito, consigo até enxergar os pequenos holandeses de 74 e os garotos húngaros de 54, inconformados por não verem Cruyff e Puskas campeões do mundo. Desde criança, não admito que meu ídolo, capitão do mágico escrete de 82, tenha deixado de levantar o caneco.
Nos anos 90, seu irmão Raí foi idolatrado por pequenos são-paulinos. Também começara em Ribeirão, também jogava de modo elegante. Tinha um físico bem mais atlético, é verdade. E – coisa de família? – também se revelou um cidadão genuíno, participativo, politizado a ponto de apresentar suas demandas, de expor suas opiniões, de buscar um Brasil melhor. Muito embora tivesse o perfil de bom-moço, e não o de intelectual boêmio, como o do meu ídolo. Ainda que não tivesse ajudado a construir uma inusitada democracia em tempos de ditadura.
Meu ídolo tinha nome de filósofo e fama de inteligente, ao contrário do ingênuo e folclórico Garrincha. Mas, como Mané, era PhD da bola. Penso que os meninos com sete anos em 62 jamais aceitariam que a bebida, e não os zagueiros, seria capaz de derrubar seu ídolo. Eu, pelo menos, não consigo aceitar.
Dizem que Pelé não torcia para o Santos aos sete anos. Meu ídolo, sim. Justamente por causa de Pelé. Mas também virou a casaca ao se ver representante eterno de uma torcida, a do Corinthians, o meu time... o nosso time! Imagino meu ídolo aos sete anos, absorto com a maestria do melhor de todos os jogadores, sua competência em ditar o ritmo e a lógica da partida. Volto aos meus sete anos, quando ficava embasbacado ao notar que meu ídolo, a seu modo, também era capaz de majestosas proezas, ainda que não se lhe outorgassem a coroa de um rei.

Ontem foi um dia, ao mesmo tempo, feliz e triste. Ontem, nosso time foi campeão e meu ídolo morreu. Lembrei-me da primeira vez que comemorei um título do nosso time. Meu ídolo jogou, foi o principal responsável pela conquista. E eu tinha sete anos.
* Escrito em 05/12/2011.
Por João Quirino