terça-feira, 22 de março de 2011

Ganhamos nota 10


Um americano de Houston, muito simpático e com extrema facilidade em falar português, estudou comigo na faculdade. Participamos de um mesmo grupo, em curso de ciência política, para apresentação de um seminário. O ano era 1995, salvo engano. Não me lembro exatamente do assunto do seminário, mas me recordo da empolgação do americano, que ficara incumbido de finalizar a apresentação. O gran finale, elaborado pelo próprio, seria um receituário de como o Brasil consolidaria sua incipiente democracia, elevando-a ao mais alto patamar. Tornar-se uma democracia como a (suspense!) democracia americana.
Lá pelas tantas, um outro colega do grupo se revoltou contra o que considerava arrogância ianque (não usou esses termos, mas tenho certeza que a expressão lhe veio à mente). Nada que abalasse a convicção e a disposição áulica do estudante texano em nos ensinar como ser democrata.
Claro que a democracia na América – para remeter à clássica obra de Tocqueville – é exemplar e paradigmática. Mas é interessante como muitos norte-americanos se veem como os promotores da democracia e da liberdade no mundo, como se, na sua ausência, o planeta todo estivesse condenado à tirania e à servidão. Estou certo que jamais passou pela cabeça do meu amigo de Houston que os EUA estiveram e continuam a estar ao lado de diversas ditaduras mundo afora, inclusive daquela ditadura militar que se impôs no Brasil entre 1964 e 85.
Sob o lema da democracia e da liberdade, Bush pai invadiu o Panamá para retirar do poder um incômodo presidente e Bush filho tomou o Iraque de Saddam com base no (sabidamente) falso argumento de existência de armas de destruição em massa. A propósito, o então presidente russo Vladimir Putin, instado pelo mesmo Bush filho a desenvolver a democracia na Rússia, respondeu, irônico: qual democracia, aquela que os EUA implantaram no Iraque?
Há dias, Obama, mantendo a tradição, exaltou o Brasil como um exemplo de democracia, um horizonte a ser seguido pelos países árabes, ora em revolta contra suas autocracias. Que bom! Nós, brasileiros, podemos nos sentir gratificados. Como o garotinho que recebeu nota 10 do professor.
Por João Quirino

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